In Compliance

Um novo mundo está se moldando bem diante dos nossos olhos e debaixo de nossos pés. Tanto nos aspectos pessoais quanto profissionais, estamos sentindo essas drásticas mudanças abalarem e desafiarem nossos padrões, comportamentos, crenças e, inclusive, nosso jeito de fazer negócios e gestão de riscos. Se não formos flexíveis, resilientes, criativos e inovadores, certamente seremos muito mais impactados. Não necessariamente de uma forma fatal, mas, quanto mais inflexíveis e reativos, certamente mais impactados.

Neste novo contexto de plena transformação, começo tratando o tema gestão de riscos eliminando um grande equívoco e uma falácia que muitos dos ditos especialistas em gestão de riscos estão repetindo – talvez para ganharem atenção – de que estamos diante de um Cisne Negro[1]. Isso não é verdade. O próprio Nassin Taleb, criador da expressão para identificar riscos imprevisíveis e altamente impactantes, declara que a Pandemia de COVID-19 não pode ser considerada como um Cisne Negro. Tanto isso é verdade que o hedge fund administrado pela Universa Investments[2] e que tem como conselheiro científico o próprio Taleb, aponta um lucro acumulado de 4.144% no primeiro trimestre[3]. Além dele o livro “O Novo Relatório da CIA” de autoria do historiador francês Alexandre Alder e até Bill Gates (esse desde 2015) comentam sobre riscos de uma pandemia.

Não dar ouvidos não significa imprevisibilidade. Assim, começo tratando a dificuldade, até de certa forma comum, de muitos gestores de risco em ler o ambiente e de empresários em dar ouvidos e tomar medidas para prevenir e mitigar os impactos caso esses riscos se materializem. Nesse aspecto a primeira dica consiste em ser equilibrado, executando uma gestão de riscos consciente e viável e que leve em conta esses aspectos externos, mas também os aspectos internos da organização. Um equilíbrio entre não ignorar sinais claros, mas também não surtar estabelecendo medidas desproporcionais para a gestão de riscos. Precisamos atuar com inteligência emocional e olhar à frente. Ter em mente que devemos atuar no presente e planejar o futuro. Foi nisso que a grande maioria falhou.

Bom. Agora o leite já está derramado. Mas não é por isso que devemos continuar ignorando os acontecimentos sem tomar ou rever medidas. Pelo contrário, o momento é de rever a gestão de riscos, reforçando, de forma inteligente, organizada e orientada a negócios para torná-la viável e factível.

A alta administração (fundadores, proprietários, diretores e gestores) precisam se mostrar presentes e atuantes reforçando as comunicações sobre o que é importante nesse momento. Claro, a sobrevivência da organização, mas de que forma? A gestão de riscos já deveria fazer parte da estratégia da organização e num momento de crise também, afinal, esse momento de fragilidade pode e provavelmente será utilizado por oportunistas.

Agora é a hora de estar ainda mais presente, ainda mais atento. Sem neuroses, mas com planejamento e atenção, com foco e ponderação. As comunicações dos gestores precisam reforçar os conceitos de que, apesar da crise, das paralizações, das mudanças de rotinas e das exceções previstas, seguirão padrões de governança, regras e controles para que o risco não se torne ainda maior. Importante continuar fazendo a coisa certa. Assim, se a empresa não possui, crie um comitê de gestão de crises multidisciplinar para que coordene e oriente todos sobre aspectos relevantes, principalmente os relacionados às exceções, como por exemplo, mas não limitado a: 1. Riscos trabalhistas: determine e comunique regras e recomendações sobre o teletrabalho, bem como procedimentos de horas extras, metas, férias antecipadas, interrupção de jornadas e mesmo demissões para mitigar riscos de processos futuros. Importante que alinhamentos sejam tratados e formalizados com trabalhadores e representantes de classe; 2. Riscos de Fraude e Cibernéticos: talvez os riscos com maior potencial de materialização num momento como este e se aproveitando das exceções geradas sem planejamento. Por isso invista na manutenção dos controles, na revisão das alçadas, bem como em procedimentos de segurança cibernética, pois talvez o teletrabalho possa permitir acesso aos sistemas da empresa por meio de computadores pessoais dos colaboradores sem a devida proteção; 3. Contratos com fornecedores e prestadores: nesse momento muitas parcerias com fornecedores e prestadores estão sendo ajustadas para a manutenção mínima das atividades. Atenção para que tais acordos sejam adequados para ambas as partes e para que estejam formalizados, mitigando riscos e litígios futuros; 4. Corrupção: além dos ditos “corruptos profissionais”, crises e impactos dessa natureza podem levar pessoas a tomar medidas desesperadas. Corruptos certamente agirão se aproveitando das brechas que também geram fraudes para cometer atos de corrupção, até mesmo assediando os funcionários.

Uma boa notícia é que essa crise passará. A má é que outras virão. Infelizmente a gestão de riscos é um processo cíclico. Por isso, é mandatório que as organizações estejam preparadas. A recomendação é que passem e pautar a gestão de riscos e a dica de ouro que eu poderia dar é para que façam isso de maneira consciente, viável e orientada aos negócios. Aos descrentes digo que devem dar mais atenção à gestão de riscos. Passem a pautar e discutir o tema de forma consciente e programada. Se ainda não possuem, nomeiem uma área responsável para elaborar – desde agora – um programa de gestão de riscos que deve olhar presente e planejar futuro respaldados em uma Abordagem Baseada em Riscos. Aos apocalípticos digo calma! Sair de uma crise como essa profetizando que tudo e qualquer coisa é um risco e assumindo um tom ameaçador apenas afastará a atenção das linhas de defesa que efetivamente devem ter a consciência e a ação para a gestão de riscos em suas áreas.

Em termos de riscos, o empresário, tendo o apoio do gestor de riscos, deve cuidar do presente – ainda que não tenha cuidado do passado, pois sempre é tempo de começar – e desde agora pensar à frente, planejar a retomada em uma nova rotina, como o cenário de riscos poderá se mostrar e, com uma análise consciente (nem catastrófica nem desleixada), planejar como prevenir e agir para que a organização esteja preparada, minimamente preparada.

 

Angelo Calori

 

[1] Taleb, Nassim Nicholas. Lógica do Cisne Negro, A: O Impacto do Altamente Improvável. Editora Best Seller. 2018

[2] https://www.universa.net/

[3]https://www.infomoney.com.br/mercados/fundo-que-tem-nassim-taleb-como-principal-conselheiro-sobe-3-600-em-marco/

Recommended Posts

Leave a Comment